Tudo que Você Precisa Saber sobre a Decisão do TJSP

Recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) proferiu uma decisão importante no campo do Direito de Família e Sucessões: a Apelação Cível nº 1000348-35.2024.8.26.0236, que autoriza o registro de um pacto antenupcial contendo cláusula de renúncia ao direito de herança. Essa decisão tem gerado debates acalorados sobre a autonomia privada, a segurança jurídica no planejamento sucessório e os limites impostos pelo Código Civil. Neste artigo, vamos explicar o que significa essa decisão e quais são suas implicações para quem deseja garantir que sua vontade seja respeitada em casos de herança.
O Que é um Pacto Antenupcial e Por Que Ele é Importante?
O pacto antenupcial é um contrato realizado entre noivos antes do casamento, onde eles estabelecem o regime de bens que desejam adotar, como separação total de bens ou comunhão parcial de bens. Esse instrumento é fundamental para que o casal organize a gestão do patrimônio durante o casamento e, eventualmente, em casos de divórcio ou falecimento.
No caso julgado pelo TJSP, o casal optou pelo regime de separação total de bens e incluiu no pacto uma cláusula específica: a renúncia ao direito de herança que cada um teria no caso de falecimento do outro. Ou seja, se um dos cônjuges viesse a falecer, o outro abriria mão de participar da divisão dos bens junto com os filhos.
Por Que o Cartório Negou o Registro?
O Oficial de Registro de Imóveis negou o pedido de registro do pacto antenupcial sob a justificativa de que a cláusula de renúncia ao direito sucessório violava o artigo 426 do Código Civil, que proíbe a “herança de pessoa viva” como objeto de contrato. O cartório entendeu que a renúncia antecipada de um cônjuge à herança do outro antes da abertura da sucessão seria equivalente a um contrato envolvendo herança de pessoa viva, algo vedado pelo Código Civil.
Essa interpretação é baseada na proibição dos chamados pacta corvina, que são acordos sobre herança futura. A legislação busca evitar que alguém seja incentivado a desejar a morte de outra pessoa para obter seu patrimônio, considerando isso imoral. Além disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia se manifestado, em várias decisões, no sentido de que a renúncia à herança só poderia ser feita após a morte do autor da herança.
A Decisão do TJSP: O Registro foi Permitido
O casal não aceitou a recusa do cartório e recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo, que decidiu de forma diferente. O TJSP, por maioria, permitiu o registro do pacto antenupcial com a cláusula de renúncia ao direito sucessório. O Relator, Francisco Loureiro, destacou que a validade dessa renúncia ainda é uma questão polêmica na doutrina e na jurisprudência, e que, por isso, não caberia ao registrador negar o registro.
A decisão do TJSP reconhece a existência de uma controvérsia doutrinária sobre a renúncia antecipada ao direito de herança. Alguns doutrinadores argumentam que, em nome da autonomia privada, os cônjuges deveriam ter o direito de dispor de seus bens como acharem melhor, inclusive renunciando à herança de forma antecipada. Já outros sustentam que essa renúncia seria nula, pois contrariaria a regra que determina que a herança só se transmite após a morte.
A Discussão Doutrinária sobre a Renúncia Antecipada
A decisão do TJSP reacende uma antiga discussão doutrinária. De um lado, autores como Rolf Madaleno e Maria Berenice Dias defendem que a renúncia feita em pacto antenupcial é válida e deve ser respeitada, já que se trata de um ato de autonomia privada dos cônjuges. Eles argumentam que a renúncia ao direito sucessório não configura um contrato sobre herança de pessoa viva, mas sim uma decisão sobre como será feita a partilha dos bens em caso de falecimento.
Do outro lado, uma parte da doutrina, incluindo jurisprudência do STJ, sustenta que a renúncia antecipada de herança é nula porque contraria normas de ordem pública. A transmissão da herança só se dá com a morte do autor da herança, e qualquer tentativa de renunciar a esse direito antes desse momento violaria o artigo 426 do Código Civil.
O Que o TJSP Realmente Decidiu?
É fundamental entender que a decisão do TJSP não garante a validade da cláusula de renúncia ao direito sucessório. O que o tribunal decidiu foi que o pacto antenupcial pode ser registrado, garantindo que ele produza efeitos perante terceiros. Isso significa que, enquanto não houver uma decisão judicial contrária, o pacto e suas disposições são reconhecidos e podem ser usados para proteger o patrimônio do casal em caso de divórcio ou falecimento.
No entanto, a questão da validade da renúncia só será analisada quando um dos cônjuges falecer e a cláusula for eventualmente questionada pelos herdeiros na Justiça. A decisão do TJSP deixou claro que o registro do pacto não implica em uma aceitação definitiva da renúncia, mas apenas em permitir que o desejo do casal seja formalmente registrado e ganhe publicidade.
O que Isso Significa para o Planejamento Sucessório?
Para quem atua com planejamento sucessório, essa decisão representa um avanço significativo. Ela possibilita que casais interessados em adotar um regime de separação de bens e organizar sua herança possam registrar suas vontades, ainda que algumas dessas disposições possam ser questionadas no futuro.
O registro do pacto antenupcial oferece maior segurança jurídica, garantindo que o regime de bens e as disposições ali contidas sejam respeitados até que uma decisão judicial diga o contrário. Em outras palavras, a vontade do casal passa a ter um respaldo formal, e o ônus de questionar essa vontade recai sobre os herdeiros que eventualmente se sintam prejudicados.
Conclusão: A Decisão do TJSP e Seus Limites
A decisão do TJSP de permitir o registro de um pacto antenupcial com cláusula de renúncia ao direito sucessório é um importante passo em direção ao respeito à autonomia privada no planejamento sucessório. No entanto, é crucial entender que esse registro não garante, por si só, a validade da renúncia. A discussão sobre a eficácia dessa cláusula ainda está aberta e depende de uma análise judicial futura.
Se você está pensando em elaborar um pacto antenupcial ou deseja garantir a proteção do seu patrimônio através do planejamento sucessório, é fundamental contar com orientação jurídica especializada. Um advogado pode ajudar a estruturar as cláusulas do pacto e preparar o melhor caminho para garantir que suas vontades sejam respeitadas, minimizando o risco de futuras disputas judiciais.
Agende uma consulta e saiba como proteger seu patrimônio de forma segura e planejada.
Dr. Pablo Henrique Testoni
OAB-SC 058147
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